Saúde Mental em tempos Pandémicos
Autor(es)
José Eusébio Pacheco
Professor Universitário, Doutorado em Psicologia da Saúde
Em março deste ano de uma forma mais ou menos abrupta e perturbadora
confrontámo-nos com a realidade de uma pandemia para a qual não
estávamos minimamente preparados. É certo que já existiam notícias sobre
o que se passava na China, em Wuhan, mas nunca se pensou que este novo
vírus, COVID-19, teria repercussões tão dramáticas como veio a acontecer
na quase totalidade dos países do mundo.
Afinal, em Portugal, já tínhamos lidado com o vírus da Gripe A em 2009, quando fomos o 11º país do continente europeu a registar casos.
Nem Portugal nem o mundo, estavam preparados para esta nova pandemia. Nesta nova realidade todos estamos confinados e em isolamento, portadores do vírus ou não. No passado o confinamento destinava-se aos portadores da doença, mas agora é para todos. Estamos na fase em que aguardamos por um tratamento e uma vacina.
As dificuldades daqui resultantes puseram os serviços de saúde à prova. Neste ponto, Portugal aprendendo com os outros países tomou medidas preventivas adequadas. Aqui uma palavra de gratidão e apreço a todos os profissionais de saúde e já agora a todos os Portugueses. Por este motivo fomos notícia pelo mundo.
Aqui chegados, diria que estamos há cerca de dois meses em isolamento e trabalhando a partir de casa na maioria das situações.
Mas este isolamento, tem consequências graves, nomeadamente na nossa saúde mental, independentemente da idade, género e profissão. Os estudos mostram que quanto maior o período da quarentena, maior o impacto na saúde mental, causando sintomas de raiva, ansiedade, medo e frustração (Medscape, 23 de março de 2020).
No caso das crianças, o impedimento da atividade física, da socialização, de brincar e o ficarem em casa (isolamento social) terão consequências que só serão visíveis mais tarde.
No caso dos adultos já hoje temos resultados desta pandemia e do seu isolamento. Recordar que profissionais de saúde pelo mundo fora devido ao seu trabalho se isolaram das famílias voluntariamente dormindo fora das suas casas com medo das consequências de um possível contágio. Numa palavra, preveniram.
Relembro o relato de um médico no Brasil, em São Paulo, que disse: “Transformei o sofrimento trazido pela pandemia em vontade de seguir em frente para ajudar os pacientes a vencer a Covid-19” – sic (Medscape, 22 de abril de 2020). No fundo, este foi o pensamento de todos os profissionais de saúde.
A ansiedade e a depressão afetaram os profissionais de saúde da linha da frente na luta contra o COVID-19, em Wuhan e noutras regiões da China, onde foram encontrados resultados que sugerem preocupação com o bem-estar psicológico dos médicos e dos enfermeiros. A depressão grave foi menor nos médicos (4,9%) do que nos enfermeiros (7,1%) (Medscape, 30 de março de 2020).
Recordo que em abril deste ano, na Lancet Psychiatry, especialistas alertaram para o possível aumento das taxas de suicídio à medida que a pandemia se for alastrando e os efeitos na economia a longo prazo se fizerem sentir nos grupos mais vulneráveis. Nesse mês era noticia na CNN que uma médica da linha da frente nos Estados Unidos se tinha suicidado, aparentemente sem antecedentes psiquiátricos.
Ainda um artigo publicado no Journal of Anxiety Disorders refere que a ansiedade é um dos fatores psicológicos que influencia a forma como um individuo responde a uma situação vivida como a pandemia. Pode funcionar como uma emoção que nos deixa alerta, no entanto em níveis elevados, pode ser prejudicial (Medscape, 23 de abril de 2020).
Também em abril, ficámos a saber que as principais manifestações dos utentes das linhas de apoio em Saúde Mental da ARSLVT eram a insónia, a ansiedade e o stresse (ARSLVT, 2020).
Todos nós vamos ter que lidar com esta realidade que nos vem impor uma nova normalidade, gerindo o melhor possível todas estas consequências. Nada será igual ao que era antes!
Faro, 14 de maio de 2020